A retórica do silêncio: a arte persuasiva na advocacia empresarial
(Entre Dinouart e Aristóteles: a arte de calar como instrumento de persuasão na tribuna e na negociação de honorários)
Nota ao leitor
Durante uma viagem de São Paulo a Recife, li A arte de calar, do Abade Dinouart. Apesar de escrita há 250 anos, a obra revelou-se surpreendentemente atual, com ideias que convergem com muitas de minhas reflexões sobre a advocacia.
Este ensaio é uma reflexão interpretativa inspirada tanto nessa obra (edição da Martins Fontes, 2002) quanto na Retórica, de Aristóteles. Não me baseio em citações literais com referências de página, mas sim no espírito dessas obras clássicas. Meu objetivo é oferecer uma leitura contemporânea sobre o uso do silêncio como ferramenta retórica na prática jurídica.
Introdução
Vivemos em uma era de discursos verborrágicos e argumentos esvaziados. Nesse contexto, uma virtude esquecida pode ser decisiva na arte de convencer: o silêncio.
Longe de representar omissão ou fraqueza, o silêncio bem empregado é uma estratégia retórica poderosa e sinal de sabedoria. Este ensaio propõe, a partir das ideias de Dinouart e Aristóteles, uma reflexão sobre como a arte de calar pode fortalecer a atuação do advogado – seja na tribuna, seja na negociação de honorários.
O silêncio como parte da retórica
Em sua obra Retórica, Aristóteles estabelece três meios eficazes de persuasão: logos (a razão), pathos (a emoção) e ethos (o caráter do orador).
Há, ainda, um elemento implícito e decisivo: o kairós, ou seja, o momento oportuno. Embora não trate diretamente do silêncio como categoria, Aristóteles reconhece que há momentos em que não falar pode ser mais prudente do que se pronunciar.
Essa interpretação sugere que o silêncio pode ser uma extensão do ethos – isto é, do caráter e da integridade do orador.
Em tempos de saturação argumentativa, o verdadeiro domínio da retórica exige não apenas o que se diz, mas o que se escolhe omitir. O silêncio, nesse sentido, torna-se uma forma de escuta ativa – não apenas do interlocutor, mas do ambiente, do contexto e da intenção comunicacional. Saber calar é, muitas vezes, uma maneira de abrir espaço para que o outro revele mais do que revelaria diante de uma fala apressada.
O advogado que compreende essa dinâmica atua não só com inteligência argumentativa, mas com sensibilidade estratégica.
O silêncio segundo Dinouart: uma arte de sabedoria prática
Dinouart classifica o silêncio em tipos distintos: o prudente, o necessário, o polido, o fingido e o silêncio da modéstia. Embora não sistematize rigidamente esses conceitos, essa organização permeia sua obra.
Tenho particular apreço pelo que chamo de “silêncio da modéstia” – apenas sugerido em algumas passagens –, típico daqueles que reconhecem seus próprios limites e evitam falar por mera vaidade.
Na prática forense, especialmente em sustentações orais, o silêncio do advogado pode ser tão persuasivo quanto suas palavras. Uma pausa estratégica, um olhar contido ou a interrupção calculada de um argumento geram expectativa e ênfase maiores do que um discurso mecanicamente contínuo.
Autor: Marcelo Magalhães Peixoto